quinta-feira, 13 de agosto de 2015

O bedelho de Telésforo

Foi por acaso que li o texto de Gregório Duvivier, intitulado Por que odiar o PT.

Igualmente foi por acaso que escrevi uma crítica a respeito, numa lista fechada de emails. 

Alguém sugeriu que eu divulgasse publicamente a crítica, então adaptei o texto e postei no http://valterpomar.blogspot.com.br/2015/08/sobre-duvivier.html

A crítica teve até agora 5.921 acessos no endereço acima.

Desconheço a repercussão em outros meios (emails, watzap, face, Brasil 247 etc.).

Dezenas de pessoas se deram ao trabalho de criticar o texto. Muitas para defender o Duvivier, várias para atacar o PT e o governo, algumas para discordar dos meus argumentos.

Busquei responder a cada uma destas críticas onde foram feitas. 

A única exceção, até agora pelo menos, é esta minha réplica ao texto de João Telésforo. 

Telésforo concorda com duas das críticas que faço ao texto de Duvivier, mas diz que me equivoco ao contestar o que -- na opinião de Telésforo--  "talvez seja o ponto crucial e mais acertado do artigo de Duvivier". 

A seguir o que diz Telésforo: O texto dirige-se diretamente aos conservadores que odeiam o PT; no entanto, faz isso não para buscar “conciliar-se com eles”, como supõe Pomar, e sim para se contrapor à sua narrativa na disputa da profunda insatisfação com o governo e o PT. Não são só “coxinhas” que compartilham dessa insatisfação (e até mesmo ódio), mas amplos setores sociais, com quem é indispensável dialogar para construir uma alternativa de mudança real para o país. Se não fizermos isso, a direita vai seguir surfando sozinha na insatisfação e revolta popular contra esse governo indefensável.

Concordo inteiramente (como pode ser verificado em muitos textos deste blog) em que o governo e o PT podem e devem ser criticados. Aliás, eu mesmo faço isto com frequência, para irritação de alguns governistas.

Concordo, também, que se a esquerda não "disputar" os insatisfeitos, a direita o fará. 

Evidentemente, tenho como prioridade absoluta recuperar o apoio dos setores da classe trabalhadora que estão insatisfeitos conosco. 

E quero "disputar a insatisfação" para corrigir os rumos do governo e do PT. Nisto, se entendi direito, divirjo totalmente de Telésforo.

Entretanto, minha principal crítica ao texto do Duvivier não reside nesta questão.

Se Gregório D. tivesse escrito um texto atacando o PT pela esquerda, muito provavelmente eu não teria me motivado a comentar, até  porque acho que o principal problema do PT está nos seus próprios erros e em segundo lugar nos ataques patrocinados pela oposição de direita.

Acontece que a crítica feita por Duvivier no texto citado parece de esquerda. 

A referência aos ratos é particularmente infeliz, não apenas pelos motivos que Telésforo aponta, mas por outras que podem ser encontradas, por exemplo, nos endereços abaixo: 


Gosto de Porta dos Fundos, respeito o que Duvivier fez durante o segundo turno de 2014, mas repito aqui o que disse noutro lugar: infelizmente, a maior parte das críticas ao PT e aos governos Lula-Dilma não são feitas pela esquerda, mas sim pela direita. Neste ambiente, é cada vez mais comum que pessoas de esquerda façam, com consciência ou não, críticas que parecem de esquerda, mas não o são. 

Exemplo: a crítica do Frei Betto segundo a qual (repito de memória, portanto com inexatidão) o problema do PT foi ter tido um projeto de poder, não de país. 

Esta crítica é totalmente falsa. 

Um dos principais erros cometidos pelo PT foi exatamente o contrário do que diz Frei Betto: foi não ter tido um projeto de poder, foi não ter querido enfrentar a classe dominante neste terreno, foi não ter enfrentado o tema da democratização da comunicação, da segurança pública, da indústria cultural, da educação privada, do financiamento das campanhas eleitorais, da reforma política e do Estado etc. 

Pois bem: muita gente de esquerda repercute a crítica do Betto acerca do "poder", sem perceber que esta crítica ecoa a visão de "poder" (e de politica) que a ideologia dominante gosta de difundir.

A crítica de Duvivier também opera no âmbito do senso comum conservador. Canta a mesma música da direita, mas com letra diferente. Tipo o que alguns de nós fazíamos na escola primária: "japonês tem quatro filhos", no lugar de "já podeis da pátria filhos".

Compreendo perfeitamente que Telésforo e outros, que querem fazer a crítica de esquerda ao governo, se sintam tentados a tentar utilizar Duvivier como alavanca.

Mas na minha opinião, embarcar no discurso do "odeio o PT tanto quanto vocês — mas por razões diferentes" só fortalece a oposição de direita, não agregando nada à oposição de esquerda.

Telésforo percebe este risco, pois afirma que dizer que o governo e o PT são indefensáveis não significa "automaticamente" lavar as mãos. 

Claro, "automaticamente" não. 

Mas se o próprio Telésforo acha melhor acautelar-se incluindo esta palavrinha, que dirá eu. 

Até porque quem não se defende, não merece defesa.

Sobre a "agenda Brasil", passo pois escrevi noutro lugar: http://valterpomar.blogspot.com.br/2015/08/sera-o-rubicao.html

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http://brigadaspopulares.org.br/?p=1775
POSTED ON 12 DE AGOSTO DE 2015IN ARTIGOS363 VIEWS

Gregório Duvivier X Valter Pomar

Por João Telésforo*
Valter Pomar está certo ao contestar a afirmação de Gregório Duvivier de que Lula teria sido eleito, em 2002, devido apenas às alianças com setores conservadores e às promessas de não realizar mudanças profundas na economia, que mexessem nos interesses de banqueiros e latifundiários.
Entende-se que o colunista da Folha tenha querido enfatizar que o PT que chegava ao governo já não era mais aquele que muitos acreditavam (terá realmente sido algum dia?), ainda mais considerando os acordos que fez. Porém, menosprezar a força da mobilização popular como fator decisivo – ainda que não único – para a eleição de Lula não é apenas uma simplificação, mas uma interpretação conservadora da história. Talvez o maior erro do PT nesses anos todos de governo tenha sido justamente endossar em boa medida essa leitura, e supor, com base nela, que a “governabilidade” deveria ser buscada sobretudonos pactos conservadores, e não na “força do povo” nas ruas.
O segundo turno das últimas eleições mostrou novamente a diferença que faz a militância quando convocada a resistir a retrocessos (imagine se fosse para se engajar não só contra o retorno do passado, mas por um projeto alternativo de futuro…).Dilma, porém,segue manifestando seu desprezo a esse fator de poder, ao se jogar a cada dia com maior sofreguidão nos braços da grande burguesia, claramente supondo ser ela quem pode realmente salvá-la do impeachment.(A rigor, talvez o problema mais grave seja que Dilma e o PT não somente cedem às pressões e chantagens da burguesia, mas compartilham de grandes linhas do seu projeto desubdesenvolvimento… Mas isso é assunto para outro texto).
Pomar tem razão também ao criticar a metáfora ‘’gregoriana” dos ratos, que transmite a ideia de que o maior empecilho às mudanças são bandos de indivíduos degenerados. Se a questão fosse só “desratizar”, operações como a Lava-Jatoresolveriam nossos problemas.Aliás, quem não se lembra da “faxina ética” que a imprensa atribuiu a Dilma no início de seu primeiro governo, com demissão de vários ministros?
O problema fundamental da corrupção não se resolve simplesmente perseguindo indivíduos ou quadrilhas específicas; é preciso romper com a lógica corrupta do sistema econômico. Na metáfora do apartamento, seria necessário enfrentar os locadores do imóvel – para construir uma comparação adequada com o Brasil, grandes capitalistas especuladores que cobrariam preços absurdos de famílias pobres, aumentariam o valor do aluguel de modo arbitrário e as chantageariam a cada momento com ameaças de despejo. “Desratizar” um apartamento nessas condições poderia ser útil para melhorar a vida do locador, mas só apoiando-se na força da luta popular (um movimento de trabalhadores sem-teto, por exemplo) ele poderia vencer as chantagens, ter condições de negociar um preço mais justo de aluguel ou mesmo ocupar, resistir e, sem pedir licença à classe-gangue de grandes especuladores, exercer seu direito à moradia e à cidade.
O dirigente petista equivoca-se, porém, ao contestar o que talvez seja o ponto crucial e mais acertado do artigo de Duvivier. O texto dirige-se diretamente aos conservadores que odeiam o PT; no entanto, faz isso não para buscar “conciliar-se com eles”, como supõe Pomar, e sim para se contrapor à sua narrativa na disputa da profunda insatisfação com o governo e o PT. Não são só “coxinhas” que compartilham dessa insatisfação (e até mesmo ódio), mas amplos setores sociais, com quem é indispensável dialogar para construir uma alternativa de mudança real para o país. Se não fizermos isso, a direita vai seguir surfando sozinha na insatisfação e revolta popular contra esse governo indefensável.
Não há defesa possível para um governo cuja “agenda Brasil” é a de Renan Calheiros, Rede Globo e companhia. Mais do que Dilma e seus ministros como Kassab, Joaquim Levy e Kátia Abreu, o PT– ou seu setor majoritário – abraçou essa agenda e se tornou indefensável, como diz Gregório. Afirmar isso não significa automaticamente, porém, ao contrário do que diz Pomar, lavar as mãos diante das ameaças golpistas. Devemos lutar contra o golpe não porque defendemos o governo, mas porque combatemos a hipocrisiae o golpismo da direita reacionária. E é exatamente o que faz Duvivier ao fim do artigo: critica quem tem ido às ruas pelo impeachment, argumentandoque ele só interessa àqueles velhos interesses conservadores (os tais “ratos”) que o PT não teve coragem para enfrentar. Não há aí indiferença ao golpe, e sim denúncia de que ele só vai agravar ainda mais os problemas estruturais do país e até mesmo a corrupção.
* João Telésforo é Mestrando em Direito, Estado e Constituição na Universidade de Brasília, e militante das Brigadas Populares-DF.

2 comentários:

  1. Tem mais um ódio que a gente pode juntar aí; o ódio dos petistas ao ver que existe uma crítica de esquerda a eles.

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    1. Tem de tudo, desde quem não aceita nenhuma crítica até os que aceitam todas. Mas nada tão divertido quanto quem joga pedra e reclama quando se devolve alguma.

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