sábado, 13 de junho de 2015

Quinto congresso do PT: primeiras observações

1.O Quinto Congresso do PT foi convocado em maio de 2013. Seus objetivos eram debater o programa e a estratégia do Partido. Os delegados e delegadas ao Congresso foram eleitos no final de 2013. Desde então reuniram-se duas vezes, sem dar conta da pauta original.

2.Com a situação criada após a campanha eleitoral de 2014, a realização de mais uma etapa do Quinto Congresso foi vista por setores do Partido como uma oportunidade para discutir como superar a "campanha de cerco e aniquilamento" movida contra nós.

3.De 11 a 13 de junho de 2015, reuniram-se em Salvador (BA) 756 delegados (51%) e delegadas (49%). A tarde e a noite do dia 11 foram dedicadas a aprovar o texto-base do Congresso e a ouvir os discursos do ato de abertura. A manhã do dia 12 foi dedicada ao lançamento da campanha de finanças do Partido. No final da manhã e início da tarde do dia 12, reuniram-se os grupos de debate. No meio da tarde do dia 12, ocorreu um seminário internacional sobre a integração latino-americana. Na manhã e início da tarde do dia 13, debatemos emendas ao texto-base. O congresso encerrou no início da tarde de sábado, 13 de junho. Ao todo, do início ao fim, cerca de 48 horas.

4.O texto-base aprovado intitula-se "Carta de Salvador". Além de uma declaração com este nome, havia também 14 resoluções anexas. Estes textos foram tornados públicos poucos dias antes do Congresso (a pesquisar e contar como e por quais motivos foi feita a substituição do projeto de resolução anterior). A maioria dos delegados e delegadas pode estudar o texto só depois dele ser aprovado como texto-base. Maiores detalhes sobre o texto estão em http://valterpomar.blogspot.com.br/2015/06/sobre-carta-de-salvador-analise.html

5.Apesar do pouco tempo, os grupos de debate foram concorridos e neles se travou intensa discussão, surgindo um número expressivo de emendas. As emendas foram sistematizadas e levadas a voto na manhã de sábado 13. As emendas efetivamente debatidas trataram basicamente dos seguintes temas: opinião do PT sobre o ajuste fiscal; política de alianças; frente de esquerda; PED; congresso constituinte do PT. Algumas destas emendas foram aprovadas por contraste; noutros casos foi feita a contagem de votos.

7.Grande número de emendas não foi debatida nem votada no Congresso, sendo remetidas ao Diretório Nacional. Parte importante dos delegados queria votar no Congresso uma emenda que proibia receber recursos de empresas privadas, seja para o Partido, seja para candidaturas do Partido. A mesa não estava de acordo e submeteu o tema ao voto do plenário; sem contar os votos, declarou que havia prevalecido que o Congresso não debateria o tema. Como reação, parte dos delegados encerrou sua participação no Congresso vaiando.

8.Ainda não está disponível a versão final das resoluções, nem o caderno com as emendas remetidas ao Diretório Nacional. Entretanto, tomando como base o resultado das votações, ficou claro que o PT não alterou sua posição em relação aos temas em debate. Ou seja: para quem considerava que a situação exigia uma mudança profunda e rápida por parte do PT, a conclusão é que o Congresso do PT optou majoritariamente por não mudar.

9.É importante dizer: naquela que talvez tenha sido a principal votação do Congresso, cerca de 45% dos delegados e delegadas presentes votou a favor de uma resolução que criticava abertamente o ajuste fiscal (uma "curiosidade" importante: participaram desta votação 572 delegados. A emenda contra o ajuste fiscal foi rejeitada por 350 delegados, ou seja, menos da metade do Congresso. Não houve nenhuma abstenção. Onde estavam, numa votação tão importante, 184 delegados/as???).  Seja como for, tanto nesta quanto nas demais, prevaleceu uma maioria contrária a criticar o ajuste, contrária a mudar a política de alianças, contrária à constituição de uma frente de esquerda, contrária à mudança no sistema eleitoral interno, contrária a realizar um novo congresso no final de 2015. 

10.Este resultado foi comemorado pelos que venceram e (estranhamente) até por alguns que perderam as votações (ver ao final dois textos de balanço que circularam logo após o termino do Congresso). Para outros, o fato de que nada mudou foi cinicamente apresentado como a "prova" de que o Congresso simplesmente não deveria ter ocorrido. E para um grande número de militantes, o que ocorreu foi sentido como uma derrota das expectativas alimentadas por setores importantes da base partidária. Expectativa que esteve presente nas etapas livres do Congresso; presente em diversas tendências, inclusive em setores das tendências que compõem o grupo hoje majoritário no Partido; bem como presente na maioria da direção nacional da Central Única dos Trabalhadores.

11.Como disse um companheiro, prevaleceu no Quinto Congresso uma postura contrária a de Tancredi (personagem de O Leopardo, romance de Lampedusa), segundo o qual "as coisas precisam mudar para que elas continuem como são" (tradução livre). Os que venceram as votações do Quinto Congresso acharam melhor não mudar nada. Será que imaginam que agindo assim as coisas vão continuar como estão? Ou que vão mudar para melhor??

12.É importante entender por quais motivos prevaleceu esta posição conservadora. Uma das principais razões é que o grupo majoritário do Partido está profundamente dividido. E como está profundamente dividido, optou pela paralisia. Além disso há outras variáveis, vinculadas a esta: importantes dirigentes do setor majoritário do Partido não compareceram ao Congresso ou apenas "bateram ponto", sem cumprir nenhum papel protagonista; o próprio presidente nacional do PT teve um papel totalmente apagado durante os debates em plenário; uma "nova geração" de dirigentes do grupo majoritário assumiu a condução do processo, com efeitos colaterais que parecem preocupar inclusive dirigentes do próprio grupo majoritário. Outra razão a ser considerada para explicar os resultados é o fato destes delegados e delegadas terem sido eleitos em 2013, correspondendo portanto a correlação de forças e as expectativas que prevaleciam na base do Partido naquele momento. Hoje, é provável que os resultados fossem diferentes.

13.Seja como for, cabe perguntar e responder qual o impacto que este conservadorismo do Congresso terá sobre o país e sobre a classe trabalhadora? Se os que ganharam o Congresso estiverem certos, o governo fará uma inflexão à esquerda, o ajuste será superado, voltaremos a ter crescimento, emprego e ampliação do bem estar. Mas se não estiverem certos, as coisas evoluirão no sentido oposto. Restando saber se haverá tempo e oportunidade para corrigirmos o rumo.

14.Igualmente cabe responder outra pergunta: qual o impacto deste conservadorismo sobre o Partido dos Trabalhadores e sua base social? Se os que ganharam o Congresso estiverem certos, a atual direção e as atuais regras de funcionamento interno vão nos ajudar a sobreviver à campanha de "cerco e aniquilamento" e também a retomar a iniciativa política. Agora, se não estiverem certos, as dificuldades vão aumentar e serão acompanhadas do desânimo, da decepção e do afastamento de parte de nossas bases. Com um agravante, que a nova geração que assumiu a direção do grupo majoritário não parece perceber (ou percebe e não dá importância): num partido democrático, não basta ser maioria; é preciso ter hegemonia e legitimidade. E um dos fatores da legitimidade é simples: as "regras do jogo" não podem bloquear estruturalmente a possibilidade da minoria virar maioria. Além disso, como destacou uma companheira em debate no grupo de conjuntura da Fundação Perseu Abramo, bem mais grave do que impedir a minoria de tornar-se maioria, é o fato das regras atuais limitarem a expressão da própria maioria da base, submetida a filtros que fazem o aparato e as finanças prevalecerem.

15.Uma vez que sejam publicadas as resoluções, caberá submetê-las à detida análise. Mas os que discordam do que foi aprovado, devem reagir adequadamente. Várias ideais surgiram já ao término do Congresso. Alguns falam em reunir, no segundo semestre de 2015, um "congresso livre" dos petistas que consideram necessário travar os debates que a maioria do congresso prefere não fazer, pelo menos não agora. Outros defendem intervir no seminário que o Partido fará para debater as "mudanças no PED", para impedir entre outras coisas que seja aprovada a esdruxula proposta segundo a qual não seria mais necessário contribuir financeiramente com o PT para poder ter o direito de eleger nossas direções e definir nossas políticas. Também se fala em exigir da direção que cumpra o prometido na "Carta de Salvador", quanto a começar um novo ciclo de desenvolvimento. Foi destacada, ainda, a importância de prosseguir o debate junto aos cutistas petistas (aliás, sem desmerecer a iniciativa dos deputados que apresentaram um manifesto ao Partido, não há dúvida de que maior sentido estratégico tem a declaração dos sindicalistas petistas).

16.Por fim, embora tenhamos combatido o bom combate, é preciso ter claro: entramos no Congresso dizendo que a estratégia do PT estava esgotada. Saímos do congresso como entramos, na melhor das hipóteses. E talvez com agravantes, entre os quais reforçar a subalternidade do Partido frente ao governo. Resultado que aumenta as pressões, tanto da direita quanto da esquerda, no sentido de "esgotar" o nosso Partido. Como disse um outro companheiro: quem venceu o quinto congresso foi a "tendência suicida". A nós caberá continuar combatendo para impedir que esta tendência destrua o Partido dos Trabalhadores, o que teria como resultado afetar toda a esquerda, piorar as condições de vida da classe trabalhadora e fazer o Brasil voltar a um papel secundário no cenário internacional. 

A seguir, dois textos de balanço que circularam logo após o término do Congresso, expressando posições distintas desta que expusemos acima.

UM RIO VERMELHO DE MUDANÇAS
No 5° Congresso o PT mudou sim!
Mudou porque se apresentou mais plural: mais jovem, mais feminista, mais negro, indígena e muito mais colorido.
Mudou ao apresentar um programa econômico para a retomada do crescimento, valorização do trabalho e da renda, com o apontamento de saídas à Esquerda para superar a atual conjuntura.
Mudou com a reafirmação da defesa de seu legado histórico no país, mas apresentando uma nova narrativa política para o próximo ciclo.
Mudou na retomada de seu papel nas lutas ao lado dos trabalhadores e trabalhadoras e ao afirmar o protagonismo na orientação política de seus governos e mandatos.
Mudou ao assegurar o debate político em grupo durante o Congresso, fundamental para produzir uma resolucão apontando para uma política militante de arrecadação financeira, a convicção em ampliar espaços de formação política, inclusive dos quadros dirigentes, e na reorientação da comunicação com a nossa base.
Mudou com a força de uma mobilização anterior, que permitiu a ampla participação dos filiados e filiadas nas etapas livres, municipais, estaduais e temáticas.
Mudou diante de um Brasil que também muda, que se transforma diante das novas demandas do povo brasileiro. E o PT vai continuar mudando porque temos, na força pulsante dos corações e mentes de cada militante, a vocação de protagonizar o novo.

*

Carta do Rio Vermelho
Manifestou-se neste 5° Congresso do PT uma força política petista nova e poderosa que, temos certeza, tem o apoio da imensa maioria dos militantes e filiados que aspiram mudanças profundas no PT. Esta força política de mudança que já traduz a maioria de 35 deputados federais e que conta com a simpatia pública de senadores, tem com o apoio da intelectualidade de esquerda, das principais lideranças dos movimentos sociais - a exemplo dos sindicalistas petistas da CUT - e de militâncias cristãs populares e que não abrem mão da ética na política.
Esta força política nova contou em várias votações com mais de 40% dos delegados e delegadas, chegando a obter 45% dos votos.
Ela conseguiu neste 5° Congresso a aprovação de uma resolução importantíssima em relação à politica econômica do nosso governo Dilma que afirma:
"Conduzir a orientação geral da política econômica para a implementação de estratégias para retomada do crescimento, para a defesa do emprego, do salário e dos demais direitos dos trabalhadores que permita a ampliação das políticas sociais" e também que o equilíbrio das contas públicas seja pago pelos que mais lucram e têm mais renda.
Esta força política poderosa de renovação apenas começou o seu trabalho. Ela deve ir ao encontro das centenas de milhares de petistas que esperam a palavra nova da mudança.
Estão começando a nascer o movimento político "Mudar o PT para Continuar Mudando o Brasil". É este movimento que pode renovar as forças políticas em defesa do governo Dilma e permitirá derrotar mais uma vez os neoliberais e conservadores.

Um comentário:

  1. Ter o papel de " grilo falante" do PT é um desejo pouco arrojado para os que ajudaram a construir , tornar real uma necessidade objetiva dos trabalhadores no Brasil , o que chamam de "nova liderança" , só poderá encontrar legitimidade entre "funcionários" e "parceiros" , os trabalhadores , a base social de luta ,não encontra nestes resultados do congresso a direção para superar a crise econômica no país e de direção no Partido . Ou alguém crer que depois de garantir fantásticos lucros aos bancos , terras dos latifundiários , riqueza aos exploradores , o governo depois de 12 anos vai criar impostos as fortunas , fazer reforma agrária radical , taxar lucros especulativos , minar o poder da burguesia ? Quem não tem telhado de vidro , quem não faz parte da ""mesa das refeições dos acordos do poder " , creio que ira romper com a passividade e pela base iniciar a construção do congresso das bases Petistas para o início de 2016 , e lá romper oficialmente com as oligarquias que assaltaram e ocuparam as direções do partido.

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