quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

VIL Fichamento 1

V.I.Lenin
Obras completas
Tomo I
1893-1894
Editorial Cartago
Buenos Aires, 1958

Primeira edição argentina (julho de 1958), baseada na quarta edição russa (IMEL).

Los nuevos desplazamientos economicos en la vida campesina (A proposito del libro de V.E.Póstnikov La economia campesina en el Sur de Rusia). 

Escrito em 1893, publicado pela primeira vez em 1923. Trinta anos de intervalo. Trata-se de uma resenha.

Tema central é a análise das transformações em curso na economia camponesa russa. 

Um aspecto interessante é o manejo das cifras estatísticas, especialmente a crítica que faz ao artifício "populista" de trabalhar com cifras médias. 

Pergunta fundamental: "quem tem razão? A 'intelectualidade urbana', que considera os camponeses como algo homogeneo, ou Póstnikov, que afirma que a heterogeneidade é enorme?" 

Outro aspecto interessante: alto domínio da "economia política científica" 
-"en la economia natural, en la que el producto va destinado al consumo del proprio productor, y no al mercado, el producto barato no se encuentra con el caro en el mercado, razón por la cual no puede desalojarlo";
-"la causa fundamental de la aparición de la lucha de intereses econômicos entre los campesinos es la existencia de un regimen en que el regulador de la produccion social es el mercado".


A proposito del llamado problema de los mercados

Escrito em 1893, publicado pela primeira vez em 1937. Quarenta anos de intervalo. 

Este texto foi publicado numa coleção (Escritos econômicos 1893-1899) da Siglo Ventiuno, com prólogo e notas de Fernando Claudin.

A propósito do chamado problema dos mercados foi apresentado pela primeira vez durante um debate, como crítica a dissertação El problema de los mercados, de G.B.Krasin.

O texto inicia assim: "Pode o capitalismo desenvolver-se, e desenvolver-se plenamente, aqui na Rússia, onde a massa do povo é pobre e continua empobrecendo cada vez mais?" 

Em seguida Lenin apresenta o ponto de vista dos populistas (segundo os quais a ausência de mercado interno impede o capitalismo de tornar-se a base da economia russa) e afirma que vai refutar este argumento. 

O texto revela, novamente, domínio da economia política em geral e de O Capital em particular (especialmente o debate sobre reprodução e circulação do capital social, tomo II).

Após apresentar os "esquemas" de produção e reprodução, ele afirma que "a explicação de como se desenvolve o capitalismo em geral não permite avançar em nada o debate sobre a "possibilidade" (e a necessidade) do desenvolvimento do capitalismo na Rússia. 

E questiona o esquema apresentado por Krasin, porque segundo ele pareceria que o capitalismo veio "de alguma parte de fora e não do mesmo meio que os 'produtores diretos'." 

Em seu lugar, Lenin apresenta seu próprio esquema de reprodução (aqui fica clara, ademais, a profunda diferente entre as posições de Lênin e as posições que Rosa Luxemburgo defenderá sobre a acumulação do Capital). 

A conclusão de Lenin é que "os limites para o desenvolvimento do mercado nas condições de existência da sociedade capitalista, são determinados pelos limites da especialização do trabalho. E esta especialização, por sua mesma essência, é infinita do mesmo modo que o desenvolvimento técnico". 

Donde ele aponta ser "errônea a afirmação de que o crescimento do mercado na sociedade capitalista, provocado pela especialização do trabalho social, deve ter seu fim no dia em que todos os produtores naturais se convertam em produtores de mercadorias".

Ele reafirma que os mercados "exteriores" são necessários, mas isto não interfere enquanto tal no raciocínio acerca do tema dos mercados para o desenvolvimento do capitalismo. 

E aponta que o "choro" dos capitalistas acerca dos mercados é uma manobra, que a "utopia e a ingenuidade populistas" acabam reforçando.

Insiste, também, que "o 'empobrecimento das massas do povo' (este membro infaltável em todo discurso populista acerca dos mercados), longe de obstaculizar o desenvolvimento do capitalismo, representa precisamente seu desenvolvimento, é condição do mesmo e o reforça".

Em seguida ele apresenta várias outras tendências e contratendências --como um todo, o texto é uma exposição teórica sobre o processo de reprodução ampliada e uma análise concreta da introdução do capitalismo na Rússia.

Na parte VII do texto, ao comparar o esquema marxista e o populista de reprodução, fica claro como a virada do populismo para o marxismo legal é fácil. Afinal, da negação do "significado e da potencialidade do capitalismo" ao deslumbramento é um pequeno passo.

Na página 122, uma frase significativa: "el capitalismo constitue hoy la base fundamental de la vida econômica de Rusia". Trata-se de um óbvio exagero. Mais adequado seria dizer que o capitalismo é a varíável fundamental, que incide sobre a base fundamental da economia russa, que é o campesinato. Os textos de Lênin nesta época acertam ao indicar o sentido, mas exageram ao analisar o estado da arte. 

Tudo ficará absolutamente claro após a revolução de 1917: o peso da economia camponesa tradicional, reforçada por uma reforma agrária radical.

Por outro lado, é acertadíssimo o método de Lenin: "O 'problema dos mercados' deve ser transferido da esfera das estéreis especulações sobre 'o possível' e 'o devido', ao terreno da realidade, ao terreno do estudo e da explicação de como vão se constituindo as formas econômicas em Rússia e porque vão se constituindo precisamente assim e não de outra maneira". (123)

Um último comentário: a maneira como ele vincula economia camponesa e capitalismo é a mesma, metodologicamente falando, adotada por Dobb. Ou seja: localizar na diferenciação interna dos produtores diretos, uma das vertentes do surgimento do capitalismo.


Quem são os amigos do povo e como lutam contra os social-democratas (resposta aos artigos de Rússkoie Bogatstvo contra os marxistas). 

Este foi escrito e publicado em 1894. Trata-se de uma polêmica direta contra os populistas, não apenas teórica, mas política no sentido estrito. O interlocutor é fundamentalmente Mijailovski e sua "filosofia subjetivista" (o método subjetivo aplicado a sociologia).

Para usar uma expressão formal, a parte inicial do livro é um debate "sociológico" acerca das teses fundamentais do marxismo. 

Vale lembrar que Mijailovski foi interlocutor e até certo ponto defensor de Marx (fato que Lenin utiliza na polêmica). A esse respeito, ver a "apresentação geral" de Fernando Claudin à coleção "Escritos econômicos" (Contenido economico del populismo, pp 1-55).

Um ponto interessante: "A idéia do determinismo, estabelecendo a necessidade dos atos do homem, rechazando a absurda lenda do livre arbítrio, não nega em nada a inteligência nem a consciência do homem, como tampouco o valor de suas ações. Muito pelo contrário, somente a concepção determinista permite valorar rigorosa e acertadamente, sem imputar todo o imaginável ao livre arbítrio. Do mesmo modo, tampouco a idéia da necessidade histórica menoscaba em nada o papel do indivíduo na história: toda a história se compõe precisamente de ações de indivíduos que são indubitavelmente personalidades. A questão real que surge ao valorar a atuação social do indivíduo consiste em saber em que condições se assegura o êxito desta ação. O que garante que essa atividade não resultará um ato individual, que se desperdiça num mar de atos opostos? Nisto consiste precisamente a questão que é resolvida de modos diferentes pelos socialdemocratas e pelos demais socialistas russos: como a atividade dirigida a realizar o regime socialista será capaz de arrastar as massas, para produzir resultados sérios?(...)" .... e daí ele parte a debater a análise acerca das classes sociais existentes.  (p.172)

Ver isto:

[las tríades en Engels no son más que vestigios de aquel hegelinianismo del que nació el socialismo científico, su modo de expresarse] p.176

[ME chamavam método dialético --por oposição ao metafísico-- simplesmente ao método científico em sociologia] p.177

Neste texto, como em outros, há polêmicas divertidas sobre a tradução dos textos de ME e outros. Não são poucas as vezes em que Lênin ridiculariza a tradução de seus oponentes, seja pela incompreensão do significado dos termos alemães, seja pela escolha dos termos em russo.

Ao final do livro, há uma nota "dos editores", apresentando a parte final [na verdade a parte III, ao que parece a parte II esfumou-se] , que é acrescida a primeira edição. 

Nesta parte final aparece um tema que será recorrente: a reclamação acerca da desigualdade de condições, entre os que atacam o marxismo legalmente, e os que o defendem ilegalmente, dada a ação da censura.

Nesta parte III, Lenin afirma que "Rusia es un país capitalista" (224)... "el capitalismo representa en si no la antítesis del 'regimen popular', sino su continuación directa, más próxima e inmediata, y su desarrollo" (229). 

Ao mesmo tempo, dirá que o debil desenvolvimento do caráter capitalista das relações conduz a formas de exploração mais brutais... 

Esta "oscilação", se podemos dizer assim, vai se prolongar durante o restante da obra. 

Na p. 308, por exemplo, ele dirá que na Rússia "os restos das instituições medievais, semifeudais são ainda tão extraordinariamente fortes..."

Nas pp 316-317 ele dirá que "a exploração do trabalhador na Rússia é em todas as partes capitalista por essência, se se deixam de lado os restos agonizantes da economia de servidão". Se se deixam...

Nas pp 248-249 Lenin contrapõe o velho socialismo camponês ao novo socialismo operário.

Na página 251 Lenin deixa claro que o desenvolvimento capitalista é progressista porque cria as condições para sua superação.

Na página 274 demarca o velho e o novo populismo: "al faltar la crítica materialista de las instituiciones políticas, al no compreender el carácter de clase del estado moderno, del radicalismo político al oportunismo político ho hay más que un paso".

Na página 284 explica as discrepância entre os social-democratas, mas seu acordo fundamental em que "Rusia representa en si una sociedade burguesa". 

É curioso que uns pela subestimação do capitalismo (os populistas) e outros por uma certa "superestimação" do capitalismo realmente existente (a vertente social-democrata que Lenin encabeçaria), ambos acabaram trilhando o caminho que os levaria a "assaltar aos céus" em 1917.

Na página 293 VIL mostra como o modo populista de pensar os fez construir um programa pequeno-burguês, dando um giro de 180 graus, do socialismo ao democratismo burguês: 
-"la labor condujo a resultados diretamente opuestos a su punto de partida"...
-"Semejante desarrollo del populismo ha sido completamente natural y inevitable, ya que en la base de la doctrina residía una idea puramente mítica sobre el régimen especial (comunal) de la economia campesina: al chocar con la realidad el mito se disipó, y del socialismo campesino se obtuvo una representación democrático-radical del campesinado pequenoburgues".

É interessante contrastar a análise teórica que ele faz do campesinato (p. 296: não são uma classe especial, só uma classe da sociedade feudal etc.) com a defesa política que ele fará do campesinato como aliado do proletariado na revolução burguesa (1905-1907).

Na p. 297 em diante há considerações sobre Chernishevski.

VIL considera as idéias populistas, quando tentam aparecer ou ser apresentadas como idéias socialistas, como INCONDICIONALMENTE (em letras maísculas) reacionárias. 

Mas ao mesmo tempo, ele pergunta qual deve ser a atitude da classe operária frente a pequena burguesia e a seus programas? (305) E responde que ao mesmo tempo que negamos seu caráter socialista, não "olvidamos" seu lado democrático.

Nas pp. 308-309 ele antecipa aquilo que será o núcleo do programa da Iskra: "lucha al lado de la democracia radical contra el absolutismo y las castas e instituiciones reaccionarias (...) la lucha contra estas instituciones es necesaria unicamente como medio para facilitar la lucha contra la burguesia, la realizacion de las reinvidicaciones democráticas de carácter general es necesaria para la clase obrera solamente como medio de desbrozar el camino que conduce a la victoria sobre el enemigo principal de los trabajadores: el capital, institución puramente democrática por su naturaleza, que en nuestro país, en Rusia, tiende de manera especial a sacrificar su democratismo, a entrar en alianza con los reacionarios para reprimir a los obreros, para frenar con mayor fuerza la aparación del movimiento obrero".

Nas páginas 314 e 315 apresenta-se o papel da "intelectualidade socialista": acabar com as ilusões, buscar apoio no desenvolvimento efetivo e não no desenvolvimento desejável da Rússia, nas relações socio-economicas efetivas e não nas prováveis, estudo concreto das contradições (todas as formas de antagonismo econômico). Em seguida, "sublinhando a necessidade, importância e grandiosidade do trabalho teórico, em maneira alguma se quer dizer que este trabalho esteja situado em primeiro plano, antes que o trabalho prático" (ele coloca PRÁCTICA em caixa alta). A tarefa dos socialistas se "reduz a serem os dirigentes ideológicos do proletariado em sua luta efetiva"... "com esta condição, o trabalho prático e o teórico se funden en un todo", que ele sintetiza usando as palavras de Liebknecth: Studieren, Propagandieren, Organisieren (p. 316).

O final do texto manifesta um desejo que caberá a guerra catalizar: "o operário russo, colocando-se a cabeça de todos os elementos democráticos, derrubará o absolutismo e conduzirá ao proletariado russo (ao lado do proletariado de todos os países) pelo caminho direto da luta política aberta (em direção) a revolução comunista vitoriosa". (p. 318)

Há um apêndice com quadros estatísticos e outro em que ele aborda uma polêmica entre Struve (a quem naquele momento ele diz não conhecer direito), Krivenko e Nik.-on. O interessante aqui é ele dizer que a "doutrina da luta de classes é o centro de gravidade de todo o sistema de concepções" de Marx. E o debate diz respeito a possibilidade (ou não) de um "caminho de desenvolvimento distinto do que há seguido e segue a Europa ocidental" (329).

Neste debate, p.333, fica claro quem Lenin inclui como parte das relações capitalistas de produção, além dos operários: milhões de kustares que trabalham para os comerciantes com o material fornecido por estes em troca de salário, peões e diaristas na agricultura, operários da construção...

Ver também apêndice III.

Contenido economico del populismo y su critica en el libro del señor Struve (reflexo del marxismo en la literatura burguesa). A propósito del libro de P. Struve, Notas críticas acerca del desarrollo econômico de Rusia, 1894. 

O texto de Lenin foi escrito no final de 1894, início de 1985 e foi publicado numa coletânea em 1895.

Neste livro, ao mesmo tempo em que se alia a Struve na crítica aos populistas, Lenin se diferencia de Struve, que já pende para o "objetivismo" que o levaria depois a virar chefe do partido liberal. 

Também neste livro Lenin diferencia claramente o velho e o novo populismo.

Na página 389, VIL faz uma defesa das reformas como forma de "acelerar o desenvolvimento do regime capitalista e portanto seu fim".

Na 412: "o marxismo vê sua tarefa principal na formulação e na explicação teórica da luta das classes sociais e dos interesses econômicos, da que somos testemunhas".

Na crítica ao Struve, página 419: "ao demonstrar a necessidade de uma série dada de fatos, o objetivista sempre corre o risco de converter-se num apologista dos mesmos". Já o materialista põe a nu as "contradições de classe e ao proceder assim, fixa sua posição. O objetivista fala de 'tendências históricas invencíveis'; o materialista fala da classe que 'administra' a ordem das coisas econômica dada, criando determinadas formas de reação de outras classes. Como vemos, o materialista é, de uma parte, mais consequente que o objetivista e aplica seu objetivismo com maior profundidade e plenitude".

E na 420 completa: "o materialismo pressupõe o partidismo, por dizê-lo assim, impondo sempre o dever de defender franca e abertamente o ponto de vista de um grupo social concreto sempre que se julgue um acontecimento".

Na p. 423 VIL questiona a idéia de que marxismo e populismo sejam a continuação do debate entre ocidentalistas e eslavófilos (vide Isaiah Berlin). Para ele, "operando com categorias como eslavismo e ocidentalismo não se pode desembrulhar de maneira alguma as questões do populismo russo". "

Na p. 423 VIL diz o seguinte: "A essencia do populismo, há que buscá-la mais fundo: não consiste na doutrina da originalidade do desenvolvimento nem no eslavismo, mas sim é expressão dos interesses e das idéias do pequeno produtor russo".

429: o conceito de formação econômico-social.

439: concorda com Zombart: "no próprio marxismo não há, do começo ao fim, nem um ápice de ética"; no aspecto teórico, o "ponto de vista ético" é subordinado ao "princípio da causalidade"; no aspecto prático, reduz a ética a luta de classes."

451: ele introduz a diferenciação entre ser ideólogo do campesinato e ser ideólogo da pequena burguesia.

455-456: defesa radical da "liberdade de comércio", contra o caráter "reacionário do protecionismo".

No capítulo IV (470) há um debate sobre a lei da população, Malthus etc.

486: aqui novamente se diz que "a base capitalista das atuais relações não deve ocultar todos estes vestígios, ainda fortes, da velha ordem das coisas da "velha nobreza", vestígios que todavia não foram suprimidos pelo capitalismo devido precisamente a seu escasso desenvolvimento".

515, novamente o debate sobre mercados "internos" e "externos", raciocínios variados que segundo Lenin se baseiam na ingênua idéia de que o capitalista "tem como finalidade o consumo pessoal e não o aumento da mais-valia" (...)

517: El el II Tomo de El Capital Marx demonstró que es perfectamente concebible la produccion sin mercados exteriores, con una creciente acumulación de riquezas y sin ninguna clase de 'terceros'..."

522: aqui ele deixa claro que entre os "marxistas legais" e os populistas, prefere os populistas na medida em que estes representam os interesses dos pequenos produtores, cuja luta por reformas o mais radicais permitiram trazer a luz o antagonismo mais importante e principal etc etc.

(revisada em 22 de maio de 2014)

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