quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A fé de Bucci

Sempre que posso, leio as colunas de Eugênio Bucci, jornalista filiado ao PT e colunista de Época e do jornal O Estado de S. Paulo.

Leio porque invariavelmente discordo do que ele escreve (com pelo menos uma exceção importante, o que ele disse acerca do facebook, ao qual tive que me curvar por razões, digamos, profissionais).

Aos que acham estranho, explico: considero um ótimo exercício intelectual polemizar mentalmente com adversários políticos e ideológicos.

Mas não costumo escrever o que penso, mais por falta de oportunidade. Desta vez, contudo, fiquei empolgado com um texto de Eugênio, denominado Para Cuba, com carinho (OESP, 21 de fevereiro).

Como indica o título, o texto de Bucci gira ao redor da blogueira cubana Yoani Sánchez.

Não vou repetir aqui o que penso acerca dela, bem como das manifestações que sua visita gerou -quem estiver interessado, há uma entrevista minha a respeito, no www.pt.org.br


Também não vou polemizar com Bucci acerca de Cuba. Suas críticas ao socialismo cubano são absolutamente convencionais. Prefiro ler Padura!

O que me empolgou desta vez foram duas passagens, que revelam aspectos muito interessantes acerca do pensamento do petista Eugênio Bucci.

A primeira passagem é a seguinte: era esperado que Yoani roubasse a cena em todos os noticiários.

Esperado? Por qual motivo? Por quem? O que afinal justifica o espaço dado, na mídia brasileira, para a blogueira cubana?

Segundo Bucci, isto teria ocorrido porque Yoani é uma dessas pessoas que se tornam símbolo de uma causa. Está para a ditadura cubana, hoje, mais ou menos como Nelson Mandela, guardadas as proporções, esteve para o apartheid na África do Sul, tempos atrás.

Claro: guardadas as proporções, todo anão se transforma em gigante. E o gato de Alice, olhando bem, fica parecido com a Mona Lisa.

Para Bucci, no que mais importa, ela é notícia porque, em sua saga pessoal, se escancara a grande contradição da qual Cuba nunca soube se libertar. Em Yoani vemos o significado final de mais de meio século da tirania da opinião que tomou conta da ilha.

Buenas, eu tenho muita dificuldade de tomar a saga pessoal desta senhora como representativa dos problemas realmente existentes em Cuba e das dificuldades vividas pelo cubano médio, agora e ao longo das últimas décadas.

Convenhamos, o cubano médio não recebe a grana que ela recebe. Aliás, se todo cubano recebesse uma mesada da direita internacional, em troca de falar mal dos problemas existentes em seu país, isto certamente geraria divisas para o Estado cubano que compensariam parte dos problemas causados pelo bloqueio. Seria uma espécie de reparação...

Mas tudo bem: cada um de nós tende a produzir heróis a sua imagem e semelhança. Se Bucci vê Yoani como uma Mandela caribenha, que se há de fazer?

Mas é exatamente aí que aparece a empolgante segunda passagem do texto de Bucci.

Segundo ele: Aí vêm as acusações conhecidas. Ela recebe fortunas do exterior. Colabora com o imperialismo. Mente. Ora, e daí? Mesmo que isso seja absolutamente verdadeiro, não muda nada. Mesmo que ela não passe de uma embusteira, isso por acaso retira dela o direito de viajar para onde bem entender?

Opa, opa, opa. Como não muda nada?

Se Mandela fosse um agente do apartheid, isto não mudaria nada???

Se tudo for absolutamente verdadeiro, se Yoani é mesmo uma mercenária, então a comparação entre ela e Mandela é puro delírio. E o fato dela ter espaço na mídia brasileira estaria mais para conspiração, do que para interesse jornalístico legítimo.

Até porque, convenhamos, ela agora tem o direito de viajar para onde bem entender. Não por uma espécie de indulto, como diz Bucci, mas porque a legislação migratória de Cuba mudou.

Yoani pode mesmo viajar o quanto quiser, pois está muito longe de ser uma pessoa comum: ela tem os recursos financeiros, obtidos já se disse como.

O ponto é: ao admitir que para ele não muda nada alguém mentir, colaborar com o imperialismo, receber fortunas do exterior e ser uma embusteira, Bucci rebaixa sua capacidade analítica à condição de .

E como fé não é minha praia, deixo aos que entendem responder se boa ou má.

Valter Pomar, membro do Diretório Nacional do PT



2 comentários:

  1. "Mandalete tropical". Bucci deve ter digitado errado. "Mandela com jeito mineiro, tipo "mande ela" Fui pesquisar no dicionário e me convenci: "Empregado geralmente menino, que leva recados ou executa tarefas leves". Só pode ser isto,

    ResponderExcluir
  2. Não concordo que seja questão de fé, para mim é questão de cumplicidade - são todos cúmplices da dobradinha CIA-SIP, que encontra em FHC seu mais perfeito teórico (dependência) e em Serra seu mais perfeito testa de ferro. É uma quadrilha multinacional a serviço de tudo, menos do Brasil, jornalistas amestrados inclusos...

    ResponderExcluir